Da luta à legislação: a evolução da proteção ao trabalhador acidentado no Brasil

Para que seja resguardado o devido amparo jurídico ao trabalhador, é impreterível a compreensão do impacto negativo causado pela alta incidência de acidentes laborais no país, o que torna preciso a constante revisão da legislação vigente para o fomento de benefícios efetivos à classe trabalhadora.

Por isso, a discussão acerca dos direitos trabalhistas frente aos acidentes de trabalho ratifica diversas transformações sociais e históricas, tornando-se devida a análise evolutiva dessa legislação.

Assim, apesar do tema dos acidentes de trabalho ter o início de seu debate formal na Alemanha, em 1884, no Brasil, sua regulamentação ocorreu tão somente em 1918, com a aprovação do projeto de lei sobre acidentes de trabalho, elaborado pela Comissão Especial de Legislação Social. O projeto resultou no Decreto nº 3.724, de 15 de janeiro de 1919, alterado pelo Decreto nº 13.493, de 5 de março de 1919, e regulamentado pelo Decreto nº 13.498, de 12 de março de 1919, que instituiu a primeira legislação brasileira voltada à reparação dos danos causados pelos acidentes laborais.

Nessa perspectiva, o Decreto nº 3.724 trouxe a inovação de estabelecer a responsabilidade do empregador pela reparação dos danos, fundamentada na teoria do risco profissional., sendo transcendental ao responsabilizar o empregador aos riscos envolvidos nas atividades profissionais dos funcionários.

Entretanto, essa primeira legislação não previu um sistema estruturado de seguridade social nem meios concretos para garantir a efetiva reparação dos danos causados por acidentes de trabalho. Dessa forma, os trabalhadores continuaram à mercê de uma estrutura precária de compensação.

Fora somente com o advento da Constituição Federal de 1934 que a legislação brasileira deu um passo importante na ampliação da proteção aos trabalhadores. O Decreto nº 24.637, que entrou em vigor nesse período, expandiu significativamente o conceito de infortúnio laboral e instituiu o seguro obrigatório contra acidentes de trabalho.

Essa ampliação do conceito de acidente de trabalho e a obrigatoriedade do seguro marcaram um avanço considerável na proteção dos trabalhadores, mas o desafio de criar um sistema mais abrangente e eficiente ainda persistia. O caminho para uma verdadeira seguridade social no Brasil continuaria a ser traçado ao longo do século XX, com a criação de novas normas e a consolidação do sistema de seguridade, que passaria a contemplar não apenas os acidentes de trabalho, mas também outros aspectos da vida do trabalhador, como a aposentadoria e a pensão.

Assim, a Constituição de 1988, um marco na história jurídica do país, consolidou a seguridade social como um direito fundamental dos cidadãos, incluindo trabalhadores e suas famílias. Dessa forma, fora ampliado o conceito de saúde e segurança no trabalho, tornando a prevenção de acidentes uma prioridade e não apenas a reparação dos danos após sua ocorrência. A partir desse momento, os mecanismos de fiscalização e as políticas de segurança no trabalho se fortaleceram, com a criação de órgãos especializados, além do avanço em regulamentações sobre a saúde ocupacional e a ergonomia.

Entretanto, apesar dos avanços significativos, o Brasil ainda enfrenta desafios para garantir que todos os trabalhadores tenham acesso pleno a esses direitos. A implementação de políticas de segurança no trabalho, a conscientização e a luta do direito sobre os riscos ocupacionais e o fortalecimento das práticas preventivas são áreas que continuam a exigir atenção e esforços.

Portanto, a história da proteção aos trabalhadores no Brasil é marcada por uma constante evolução, refletindo as mudanças sociais, políticas e econômicas do país. A legislação, que começou tímida e restrita, hoje representa um avanço importante na busca por justiça social.

Dessa forma, é impreterível que a luta em prol do direito trabalhista se mantenha, para que os trabalhadores possam contar com uma rede de proteção cada vez mais ampla e eficaz, garantindo, assim, não apenas a reparação, mas a prevenção e a promoção de condições de trabalho mais seguras e dignas, ressaltando em especial a conscientização e a participação dos trabalhadores, empregadores e todos os demais atores envolvidos nessa luta cotidiana de se evitar orgulhosamente os acidentes de trabalho.

*Esse artigo foi escrito em conjunto com a brilhante acadêmica de direito Juli Rolim Daher Ferro.

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