Qual o (real) interesse em ressuscitar o inútil extintor no automóvel?

A obrigatoriedade do extintor nos carros, extinta há 10 anos, corre o risco de voltar. Este equipamento foi obrigatório no Brasil de 1970 a 2015. Nestes 45 anos, eram maiores as possiblidades de incêndio no automóvel, pois ainda existiam carburador e distribuidor, que já estão há tempos no museu, substituídos por sistemas eletrônicos.

Porém, mesmo no passado, a obrigatoriedade do extintor era questionada pois:

  1. O motorista geralmente não sabia onde estava;
  2. Quando sabia, não tinha idéia de como manejá-lo;
  3. Ainda que soubesse, ele raramente era capaz de apagar o fogo.

A obrigatoriedade deste equipamento em vários países foi eliminada quando surgiram tecnologias mais modernas incorporadas aos automóveis: a eletrônica reduziu substancialmente os riscos de incêndio. No Brasil, ele continuou sendo exigido apenas em veículos pesados: caminhões, ônibus, micro-ônibus, etc. Já para automóveis, utilitários, camionetes e triciclos de cabine fechada, o uso do extintor tornou-se facultativo.

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Do nada, surge a proposta do retorno

Entretanto, sem que tenha surgido nenhum fato novo, o deputado federal Moses Rodrigues (Cidadania/CE) apresentou um projeto de lei propondo a volta do extintor. O PL recebeu parecer favorável da comissão que teve como relator o senador Eduardo Braga (MDB-AM) e será encaminhado agora para votação no plenário.

Os defensores da volta do extintor se valem de estatísticas que apontam risco de incêndio nos automóveis. Entretanto, consideram também os veículos mais antigos, antes da eletrônica, com motores que funcionavam com carburador e distribuidor.

Entidades do setor são contra

Enquanto parlamentares tentam aprovar a medida, entidades do setor se manifestaram contrárias à proposta, entre elas a Anfavea (associação das fábricas de automóveis) e a AEA (dos engenheiros automobilísticos).

Segundo a Anfavea, os atuais requisitos de segurança veicular, como estrutura projetada para a deformação da carroceria no caso de impacto, proteção ao tanque de combustível e uso de materiais anti-inflamáveis dificultam consideravelmente o início e a propagação de chamas. Segundo a entidade, a volta da obrigatoriedade vai na contramão do que ocorre na maioria dos países com requisitos técnicos similares aos nossos, como os EUA ou países europeus.

Já Hilton Spiler, diretor de Segurança Veicular da AEA, “gostaria de enfatizar que o retorno da obrigatoriedade de extintores não se aplica no Brasil porque não surgiram fatos novos que necessitem de uma revisão técnica”.

R$ 4 bilhões explicam a volta do extintor

A rigor, desde que o Contran eliminou a exigência do extintor em 2015, seus fabricantes já investiram várias vezes na tentativa de voltar com a obrigatoriedade. Em 2019, por exemplo, houve proposta para se tornar o item obrigatório novamente, rejeitada pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE)

Mas a explicação real para o retorno da obrigatoriedade do equipamento são os interesses financeiros: basta multiplicar mais de 40 milhões de automóveis em circulação por cerca de R$ 100 (preço de cada extintor) para se chegar a um faturamento inicial de R$ 4 bilhões, acrescido anualmente de todos os carros novos e mais a reposição dos que expiram. Então, sob o manto das estatísticas e temores com as chamas, os motivos de fato para a volta desta exigência são inconfessáveis.

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Maioria das pessoas não sabe utilizar o extintor de incêncioo (Foto: ShutterStock)

Os “argumentos” dos lobistas e fabricantes não resistem às opiniões técnicas que não defendem sua necessidade e nem mesmo a capacidade do extintor em debelar as chamas. Especialistas afirmam que ele só tem utilidade se manejado com precisão. “Esse item de segurança só deve ser utilizado no combate às chamas por quem saiba utilizá-lo, tiver algum treinamento ou no princípio do incêndio”, disse o Tenente Henrique Barcellos, porta-voz do Corpo de Bombeiros de MG.

Então o extintor, extinto nos países desenvolvidos, corre o risco de voltar e alinhar o Brasil com alguns raros outros, inclusive alguns nossos vizinhos sulamericanos. Os congressistas devem votar em fevereiro o projeto que exige sua volta. Ainda bem que não há unanimidade entre eles.

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